sexta-feira, 30 de julho de 2010

Independência.

O dia estava um tédio. Eu me imaginava independente trabalhando a semana toda, mas saindo pra curtir e beber o final de semana dirigindo uma Ferrari, rico e com várias mulheres ao lado. Isso quando eu tinha 15 anos, mas hoje vejo que não é bem assim.

Moro num maldito apartamento sala-e-quarto. Tudo bem que minha mãe me ajudou a comprar algumas coisas, o emprego de garçom não é o mais lucrativo. Mas dá pra ter o mínimo de luxo, tipo muitos calos nos pés, chulé, e poder passar os dias de folga coçando o saco.

Era um domingo. Eu não sou do tipo cheio de amigos, o tédio por vezes me consome. A independência tem umas merdas grandes até demais, por exemplo, simplesmente cortaram a internet. Ou seja, fiquei sem RedTube e a última vez que comi alguém foi pagando. Paguei R$30, então imagina o naipe da criatura. E ultimamente tô tão cansado que não consigo pensar em nada que seja dormir, até pra bater punheta tá me faltando imaginação. Porra, e pensar que já tenho 25 anos! Eu queria ficar rico antes dos 20, escrever 5 livros antes dos 18 e ser o maior pegador antes dos 16. isso quando eu tinha 15 anos. Aquela época era bem melhor, véio, sem noção.

Já, já vai começar o Pânico na TV, mas tô sem um pingo de bom humor. Porra, eu queria ter uma Ferrari agora, não agüento mais pegar um ônibus lotado. Enfim, é a quinta vez que assisto a Cães de Aluguel. Mês que vem, quando o salário sair, alugo Pulp Fiction. Assistir filme bom uma vez por mês é foda. Mas vale a pena, o Tarantino é um verdadeiro gênio.

Bem, até aqui meu domingo tava totalmente normal, sem nenhuma coisa incomum. Vez ou outra passava um carro no meio da rua tocando música eletrôniva. Eu que devia tá dirigindo um carro com som grande tocando música eletrônica, porra. Só escuto música porque às vezes vou pra casa da mamãe e gravo uns CDs no computador dela e boto pra tocar um sonzinho que tenho aqui. Mas ultimamente eu não tenho escutado pra não gastar energia. Tá foda.

Porra, eu queria ter minha Ferrari agora. Enfim, essa minha vida tá uma merda. Caralho, adoro essa cena que o Mr. Blonde arranca a orelha do policial, é carnificina total. Afinal, é a marca do Tarantino, todo esse sangue. Merda, se eu tivesse passado na faculdade de cinema eu poderia estar fazendo bons filmes hoje.

Certo, não agüento mais me empanturrar de Doritos e Nova Schin. Aliás, odeio Nova Schin, só bebo porque é o jeito. R$o,97, é o que se pode com alguns trocados.

Se eu morresse agora, será que alguém sentiria falta de mim? Acho que só minha mãe. Devo ter sido a grande decepção dela, ela queria um filho médico. É uma boa pessoa, tudo o que queria era me ver independente, e cá estou eu. Agora todo final de ano ela viaja para algum estado diferente, fez amigas novas da mesma idade, ela até que tá bem. Eu é que tô cada vez mais fodido.

Certo, quando ela morrer eu me suicido. Mesmo se ela me deixar um dinheirinho, acho que não vai dar nem pra tentar uma faculdade particular. Tentar ser alguém. Pera, ela tá me telefonando.

Merda, era a vizinha. Ela acabou de ter uma parada cardíaca, falei com ela ontem. Merda, emrda, merda! Tudo bem. Porra, mãe, como você pôde? Ah, vai, tudo bem. Já tava com 70 anos, coitada. Tudo bem, tudo bem.

Ainda não assisti o filme da Liga da Justiça, nem dos Vingadores. Ah, tá beleza. Posso conviver sem isso. Ainda bem que esse prédio vagabundo e caindo aos pedaços é bem alto, moro no 12º andar. São 12 apês por andar, sem área de lazer. Mas dá pra eu morrer.

Porra, essa brisa é muito gostosa. Esse vento, essa sensação de liberdade. Putz, esqueci de deixar uma carta! Ah, que diferença vai fazer? Bem, lá vamos nós!

Caramba, essa queda livre é fantástica e... pera, que dia é hoje?

Puta que pariu! Hoje é 1º de abril, a vizinha é minha irmã, que todo 1º de abril liga dizendo que a mamãe morreu.

É, o chão tá cada vez mais perto. Minha mãe vai me matar quando me achar morto.

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