quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Dejà vu

A madrugada estava silenciosa, talvez até demais para uma época tão conturbada. Perambulando pelas ruas, ouviu um grito rompendo as trevas. Era um grito feminino. Um grito próximo. Vinha de duas quadras adiantes, talvez três. Correu.

Ainda era jovem, possuía o antigo fôlego. Quando dobrou a terceira esquina, num beco sem saída, viu o vermelho pintando a parede suja. O vermelho num tom conhecido, que deixa o ar com cheiro de vida se esvaindo. Havia uma mulher negra e corpulenta caída, como uma boneca de pano esquecida numa caixa de brinquedos. Aproximou-se, checou o pulso. Não poderia fazer nada por ela.

Então ouviu um som vindo de outro cômodo. Cômodo? Sim, era só uma lembrança de outrora reaparecendo em sonho.

Olhou o relógio do lado de sua cama, o ponteiro já marcava quatro da manhã. Levantou-se, vestiu seu robe. Foi até uma estante de livros e moveu um exemplar de O Conde de Monte Cristo. A estante deslizou para o lado, abrindo passagem para uma escada mal iluminada. Desceu até a caverna.

- Patrão Bruce? - disse.

- Estou aqui, Alfred.

Observou a expressão de um rosto sem máscara. Uma expressão já conhecida. Uma expressão de culpa. A mesma expressão que estava em seu rosto quando não pôde ajudar a negra corpulenta.